Os sebos chegam à versão online

Na capital paulista, quem passou a vender pelo computador consegue tirar até 50% do faturamento da internetO lançamento mundial do leitor digital Kindle, motivo de discussões sobre o futuro dos livros de papel, ainda está longe de alterar a rotina dos sebos de São Paulo. A era digital, pelo menos por enquanto, tem sido uma aliada dessas lojas graças à internet. Quem conectou os acervos se deu bem: além de manter a clientela fiel na loja, esses sebos já tiram até 50% do faturamento das vendas virtuais.

O site Estante Virtual (www.estantevirtual.com.br) reúne grande parte desses sebos. Das 1.600 lojas e livreiros virtuais cadastrados em todo o País, mais de 400 estão na capital. Os leitores com cadastro também podem vender obras diretamente aos interessados. “É como se um outro Brasil tivesse passado a comprar. Temos dado força para os sebos ampliarem a atuação e melhorarem o serviço”, diz André Garcia, criador do portal. Frequentador desses locais, ele considera o site “imbatível” para procuras específicas. “Mas para quem quer garimpar, o sebo é fundamental. Às vezes o livro é que acha você e não o contrário.”

A estudante Franscimeire Neves, de 27 anos, costuma ser “achada” pelos livros quando namora sem pressa as estantes. De passagem por São Paulo, ela aproveitou para visitar vários sebos, em busca da bibliografia necessária à conclusão do mestrado em Economia. “Há livros importantes para a minha pesquisa que as editoras não editam mais”, explica ela, que nunca comprou pela internet. “Prefiro conhecer o espaço para ver a bibliografia riquíssima que ele guarda. Sempre saio com pelo menos um livro.”

Frequentador de sebos desde 1987, Gesualdo Pereira já esteve em mais de cem deles em busca de gibis para a sua coleção. “Gosto de fuçar, achar coisas da época em que não era nem nascido. Já cheguei a pagar R$ 60 em um quadrinho antigo.”

Mesmo as lojas mais antigas e tradicionais da cidade decidiram investir na internet para atrair novos clientes. Há 39 anos no mercado, o Sebo do Messias, mais antigo em funcionamento na capital, abriu há dois anos uma loja na web. Todo o acervo cadastrado para o portal é separado dos livros acessíveis ao público nas três lojas localizadas no centro. “Para a população de São Paulo não mudou muito porque minha clientela gosta de vir aqui, mas comecei a vender livros de norte a sul do País”, comemora Messias, que faz cerca de 150 vendas online por dia. Segundo ele, todos os produtos são fotografados e descritos detalhadamente. “O site tem tido sucesso muito grande porque o cliente vê o que está comprando”, diz.

O Sebo Brandão resistiu, mas acabou aderindo ao comércio virtual há dois anos. “Foi uma coisa boa, mas tirou o cliente da livraria, infelizmente”, diz Brandão Jr., proprietário da loja há 32 anos. Para ele, o livro digital vai contribuir para o fim das livrarias. “Enquanto houver livro no mundo, os sebos e livrarias vão continuar, mas a nova geração não terá mais interesse neles. Sobrarão apenas os colecionadores.”

O bibliotecário Eduardo Conceição, proprietário dos sebos Dom Quixote e Pauliceia, também imagina um futuro com pouco espaço para os sebos. “O público que gostava do charme do sebo bagunçado, de conversar com o dono, está sumindo”, lamenta. Ele começou a investir em cursos de encadernação e restauro e se prepara para mudar o perfil do estabelecimento. “Só vai sobreviver nesse mercado quem investir em livros de arte e obras raras.” Já André Garcia, do Estante Virtual, tem uma visão mais otimista. “A crescente dependência do computador será uma razão para as pessoas continuarem a buscar livro em papel. É um momento de descanso, uma pausa nessa cultura do virtual.”

Novatos no mercado

Há um ano no mercado, Francisco Carmona considera que o leitor digital virá apenas para dividir uma fatia de mercado. Ao contrário dos donos de sebos tradicionais, ele começou como livreiro virtual e abriu o Sebo Mandrak, na Lapa, há apenas um ano. O primeiro acervo foi adquirido num leilão online. “Como estava começando no ramo, a internet foi muito importante. Jamais me arriscaria em abrir a loja de cara.” Com 10 mil livros, vende cerca de 80% das obras pela web.

O Sebo Fenix, na Vila Mariana, também começou na internet e o proprietário César Potério acabou adquirindo há um ano e meio um espaço que estava para fechar. Ele afirma que sempre foi “rato de sebo”, mas prefere manter o local muito bem organizado. “Os clientes cobram isso. Até os ratos de sebo passaram a selecionar ambientes mais organizados. Ofereço um preço justo e procuro manter o acervo atualizado para deixar o cliente satisfeito. Se fica tudo do mesmo jeito sempre, eles não voltam.”No Cantinho das Letras, os donos Sônia e Francisco Arcari também fazem questão de um ambiente limpo, sem a poeira e as pilhas de livros que costumam povoar o imaginário de quem pensa em sebo. Na internet, Sônia cadastra somente livros com pouca saída na loja. “Livros mais técnicos têm mais saída pela internet”, diz Sônia. As vendas aumentaram cerca de 30% com o site.

Fonte: Estadão On Line – 19/10/2009